domingo, 10 de julho de 2016

O véu de Valquiria

É tão estranho mostrar meu rosto... Eu, que tenho sido uma sombra terrivelmente apaixonante, um lobo mascarado, um martírio suicida.
Deixei-me sucumbir a uma ridícula paixão adolescente ou simplesmente cresci? Talvez ambas as hipóteses sejam válidas.
Ela nunca me quis morto, quem o quisera era eu.
Valquíria talvez me tenha amado. E ela nunca precisou de nada senão de palavras.  Refiro-me àquele tipo de rima apaixonada que em métrica exata comovia o mais frio coração (leia-se o meu coração).
E talvez de sua carne não se tivesse saciado meu ódio quando encontrei seus olhos, ternos e temerosos, sob o véu negro do mistério que a envolvia.
Seu nome, desconhecido, enegrecia aquele véu do diabo, enquanto seu toque,  abstinente de alguma resposta, selava-o agora a minha face, uma vez que o rosto da dama se deixara revelar.
E eu, nos braços de Valquíria,  apeguei-me ao disfarce de lobo mau quando por dentro ela me fizera sentir um mero cordeiro. Adicionando uma dose de realidade, por dentro eu era uma ovelha negra.
Eu tinha aquela rebeldia jovem, o espírito ateu moderno,  a vontade de não mais ter vontades. Eu tinha a mim, a Valquíria e a meus pensamentos suicidas.
E como que por dó de mim o suicídio nao tardou a responder-me.
A bofetada que partiu de minha mão dirigia-se ao rosto, mas foi interceptada pelo véu do sigilo de Valquíria.
Aquele véu... Maldito véu. Mal-dit-o-véu. Malditos véu, máscara, pele de lobo, rosto oculto. Aquele era o véu que me impunha respeito, mistério, temor, mas essa admiração não era imposta por mim, e sim pela dama que tecia o véu junto à sombra de minha mente.
Então, deixei que meus olhos se enchessem das mais odiantes lágrimas e cuidei para que a raiva borbulhasse pelos dentes lupinos que traziam-me à realidade.
Não que ela me quisesse mal. Ela entendia que assim que alguém quebrasse meu anonimato eu já não seria mais aquele espírito jovem.
Eu certamente a perdoei.
Mas seria impossível perdoar a mim mesmo com aquela seda vexaminosa.
Com um golpe rasguei o pano preto da vergonha. Abracei a morte. Larguei a pele. Deixei Valquíria. Apesar de sentir-me inseguro, mostrei o rosto.