domingo, 19 de abril de 2020

Você viveria de amor?

Porque as pessoas não vivem de amor,
Porque quando se tem fome,
Quando na escuridão
Do teu coração vazio
Brilha a chama
Do saber-se que ama,
Consome-se cada víscera etérea,
Cada tripa vazia,
A miséria devorando
A companhia.

E você, ousaria viver de amor?
Sem saber qual ocasião,
Sem saber de qual tripa
Fazer coração?
Sem saber se vai doer porque é sua
Ou porque não é,
Se todo o sangue derramado ao chão
É razão pra desnutrir o corpo teu
Seja ele o que passava por teu coração
Ou pelo meu.

Mas, quando o sangue tiver coberto
O chão,
Quando teu peito aberto
Pulsar a desnutrição,
Você se alimentaria da carcaça,
Viveria do alimento que já chamou sentimento,
Você viveria de amor?
Ousaria tocar nas feridas do amor?

Porque quem não vive de amor não ama
Não se ousa devorar a própria chama,
Mas viver de amor,
Mais do que escapar da morte,
Está além da víscera
E do corte.

Porque quando havia pão,
Vivemos de amor e de pão,
E quando houver sangue,
O amor ainda será como o pão,
E não se encontra carcaça,
Nem tripa,
Nem víscera
Onde se ousou viver de amor.
Pra viver de amor, há de encher de vida o amor, ou não se viverá.

Mas vivemos.
E se ao tentar, em meio ao desespero,
Devorar o amor para saciar-se,
O amor for feito de sonhos,
Não existe jeito de devorá-lo
Porque sonho não mata fome.
Exceto o da minha vó.
Mas de sonho se vive,
Se vive de amor.