Porque as vi zanzando
Aquele dia,
Por sobre a floreira, profetizando
Minha maldição derradeira,
Como minhas centelhas,
As abelhas diziam, ornando a flora
Tudo o que sentirei
Para além de agora.
Agouros outrora,
Voavam desparelhas
Por flores vermelhas,
Marrons depois de passada minha hora
Quando me acometeu a insensatez
De acreditar nas macias
Zumbidas profecias
Pela primeira vez.
Guardarei para sempre a imagem
Da abelha solitária, ao voar
E pousar no meu copo
Numa mesa de bar:
Ao romper o medo
Daquele que me acompanhava,
Ofereci o dedo
E quando ela pousou, indefesa,
Arauto de minha sorte,
Cantei sua beleza
E previ sua morte.
Porque o universo a trouxe ao meu dedo,
Cobriu-me como pólen
O desejo zanzante,
O lampejo febril
Pelos toques profanos
Que ecoa por anos após aquele abril.
As abelhas em meu estômago,
Por inocente que fosse devorá-las nos tempos idos,
Vez ou outra me conectam a ontem
Pois ainda rompem os meus tecidos.
Enfeiticei minha vida de abelhas
E por isso me assombra o que ainda pode vir,
Pois o encanto dos versos
Que ainda canto
É que as coloca para dormir.
Porque as vi zanzando
Aquele dia,
E já não mais cantavam minha elegia,
Tú, que cruzou minha trajetória,
E a quem narro
Minha história,
Ainda leigo de minha maldição,
Me oferecestes feito enxame
A possibilidade de que talvez ainda ame
Ao tocar minha mão.
Desperto agora as abelhas,
Com o devido medo ou respeito,
Porque abril ainda era cedo
Pra ferroar meu peito.
Porque tens traços suaves
Dos lábios à sobrancelha,
Tenho um cuidado, carinho esse
Feito o dedo a uma abelha oferecesse
Pois és hoje beleza,
Amanhã não sei se dor.
Temo por meu estômago,
Enquanto procuro a efeito do peito torpo
Teu calor febril,
Teu perfume que já se esvaiu
De meu corpo.
Temo mas não mais prevejo
Arriscar um palpite
Que não teu beijo.