quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Poema para as abelhas dormirem

O deus e o meu castigo:

Quem é você,
Que brinca com uma seta errante,
Irresponsável caçador de perigo
Incansável redentor
Do meu castigo?
Que não admite
Em cada um destes lamentos
Que você chama de lira
Aonde você sabe
Que aponta tua mira?
Que chega marcando meu destino,
Rude, intenso,
Chega invadindo
Minha filosofia,
Alguma consciência,
Antes ruindo
Minha sóficiência.

Quem é você,
Que tem medo de indagar
As antriguidades recentes dos
                    [meus poemas?
Que tem medo de reorganizar
Com a clareza
Da absoluta certeza
As palavras que eu manipulei
Pra proteger o implícito do
                    [silêncio,
Silêncio este que já confirma
A reciprocidade do implícito?

O amante desconhecido:

Que forma tem você
Que sei que não é nenhum monstro,
Que tenho medo de espiar,
Porque não é real,
Nem nítida,
Nem igual
A você?

Que voz tem você,
Que tem um timbre doce e
                    [autoritário
E que não sei dizer certa qual é?
Qual a tua prosódia,
Senão a sequência de notas de um
                    [flautista
Fixado aos meus sentidos
E não à minha memória?
Quem é você,
Que não ouviu tudo,
E não contou tudo
O que ainda rumina,
Invicto no sagrado silêncio?
Com que voz
Você, que nem tem voz,
Por um segundo calaria
Nossos calos?

Que cheiro tem você
Que não está no sabonete que uso,
Mas está em todos os cangotes
De quem cruzo
E torna todos os cheiros
                    [necromânticos?

Que imagem tem você
Senão toda a beleza que a câmera
                    [do celular jamais
                     poderia capturar?
Algum (físico que) me indique
Se o ponto em que a energia vira
                    [matéria
Intercepta o eixo
Em que pathos se converte em
                    [miséria.

Quando eu tentei te matar:

Quem é você
Que espio, de fininho,
Procurando o monstro
Que eu preferia que fosse
Pra não assumir que o erro é meu,
Que pra mim tanto faz,
Mas seria feliz
Se você existisse?

Quando eu te perdi:

Quem é você,
Senão mais uma lápide em que
                    [me atiro?;
Que é este poema
Senão uma elegia autobiográfica?
Quem é você,
Senão a prova de que o alto da
                    [colina
Tem o céu cheio de vagalumes
E o fundo do poço
É um cemitério de abelhas.

(Quando?):

Que sente você,
Que tem medo do inferno
E por isso não me salva daqui?

Quem é você:

Quem é você
De quem conheço tantos erros,
Quem é você senão Eros
Atormentando minha psiquê?

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Aquela marca na nossa página

Não sou ladra de livros,
Caçadora de recompensa, sou quase
                    [o inverso.
Eu só sempre quis
Entender que tipo de universo
Você troca pela vida.

Você leu pouco demais
Para aprender a convencer
E o seu jogo de quatro peças,
Bom dia e tá tudo bem
Não engana ninguém.

Quando tive raiva de você,
Me neguei a aprender o seu mundo
Sem perceber
Que eu vivia, mesmo que sozinha,
Em cada estrofe,
Em cada entrelinha.

Quando tive raiva de você,
Quis rasgar todas as folhas
Até me encontrar ali
E sentir que doía em mim também.

Então voltei à página
Do meu poema favorito,
Armada,
Com a ponta afiada
Do bico número cinco.

E aquela poesia
Tão curtinha,
Amada,
Com a melancolia da tinta
Aos poucos foi marcada.

Você não larga essa ficção,
Não enquanto viver,
E aquela página sempre estará
Isolada, mas não sozinha.

Você vira se quiser,
Mas nos seus intertextos da vida,
Ela sempre será sua
E também sempre será minha.