quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Poema para as abelhas dormirem

O deus e o meu castigo:

Quem é você,
Que brinca com uma seta errante,
Irresponsável caçador de perigo
Incansável redentor
Do meu castigo?
Que não admite
Em cada um destes lamentos
Que você chama de lira
Aonde você sabe
Que aponta tua mira?
Que chega marcando meu destino,
Rude, intenso,
Chega invadindo
Minha filosofia,
Alguma consciência,
Antes ruindo
Minha sóficiência.

Quem é você,
Que tem medo de indagar
As antriguidades recentes dos
                    [meus poemas?
Que tem medo de reorganizar
Com a clareza
Da absoluta certeza
As palavras que eu manipulei
Pra proteger o implícito do
                    [silêncio,
Silêncio este que já confirma
A reciprocidade do implícito?

O amante desconhecido:

Que forma tem você
Que sei que não é nenhum monstro,
Que tenho medo de espiar,
Porque não é real,
Nem nítida,
Nem igual
A você?

Que voz tem você,
Que tem um timbre doce e
                    [autoritário
E que não sei dizer certa qual é?
Qual a tua prosódia,
Senão a sequência de notas de um
                    [flautista
Fixado aos meus sentidos
E não à minha memória?
Quem é você,
Que não ouviu tudo,
E não contou tudo
O que ainda rumina,
Invicto no sagrado silêncio?
Com que voz
Você, que nem tem voz,
Por um segundo calaria
Nossos calos?

Que cheiro tem você
Que não está no sabonete que uso,
Mas está em todos os cangotes
De quem cruzo
E torna todos os cheiros
                    [necromânticos?

Que imagem tem você
Senão toda a beleza que a câmera
                    [do celular jamais
                     poderia capturar?
Algum (físico que) me indique
Se o ponto em que a energia vira
                    [matéria
Intercepta o eixo
Em que pathos se converte em
                    [miséria.

Quando eu tentei te matar:

Quem é você
Que espio, de fininho,
Procurando o monstro
Que eu preferia que fosse
Pra não assumir que o erro é meu,
Que pra mim tanto faz,
Mas seria feliz
Se você existisse?

Quando eu te perdi:

Quem é você,
Senão mais uma lápide em que
                    [me atiro?;
Que é este poema
Senão uma elegia autobiográfica?
Quem é você,
Senão a prova de que o alto da
                    [colina
Tem o céu cheio de vagalumes
E o fundo do poço
É um cemitério de abelhas.

(Quando?):

Que sente você,
Que tem medo do inferno
E por isso não me salva daqui?

Quem é você:

Quem é você
De quem conheço tantos erros,
Quem é você senão Eros
Atormentando minha psiquê?

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Aquela marca na nossa página

Não sou ladra de livros,
Caçadora de recompensa, sou quase
                    [o inverso.
Eu só sempre quis
Entender que tipo de universo
Você troca pela vida.

Você leu pouco demais
Para aprender a convencer
E o seu jogo de quatro peças,
Bom dia e tá tudo bem
Não engana ninguém.

Quando tive raiva de você,
Me neguei a aprender o seu mundo
Sem perceber
Que eu vivia, mesmo que sozinha,
Em cada estrofe,
Em cada entrelinha.

Quando tive raiva de você,
Quis rasgar todas as folhas
Até me encontrar ali
E sentir que doía em mim também.

Então voltei à página
Do meu poema favorito,
Armada,
Com a ponta afiada
Do bico número cinco.

E aquela poesia
Tão curtinha,
Amada,
Com a melancolia da tinta
Aos poucos foi marcada.

Você não larga essa ficção,
Não enquanto viver,
E aquela página sempre estará
Isolada, mas não sozinha.

Você vira se quiser,
Mas nos seus intertextos da vida,
Ela sempre será sua
E também sempre será minha.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Vênus em aquário

   Sei que naquela manhã você acordou com um sentimento de vazio. Ou da cama, ou do coração, ou da sua caneca de café. O au latte ao seu gosto estava longe de preenchê-la.
   Talvez tenha sido falta de atenção sua não perceber que aquele lençol azul ciano ofendia a minha memória. E a voracidade com que engoli seu corpo em abraços era dedicado ao novo tema, quem dera minha alma pudesse separar as coisas e as policromias da vida.
   Aquele era um tom ciano infeliz, ironicamente doloroso, porque era exatamente o tom perfeito da minha cor favorita. Doloroso e bom como as suas unhas roçando devagar as minhas costas nuas. Mas, sob a luz das velas, eu morria muito mais no tom de azul em que eu me queria estar aninhando para sempre.
   Você deve ter percebido em meu olhar que os seus lençóis foram a minha primeira partida daquele dia. Nada além do meu corpo, nu e largado, sujo e exausto, marcado por dentes e unhas e cordas e mãos, feito de músculos e ossos e pele e o que quer que se chame vida, estava lá. Minha alma mergulhava naquela imensidão azul. Ou talvez não era você que estava lá - gosto mais de crer nessa hipótese - e sim a origem longínqua e melancólica dos seus lençóis (ou a origem das memórias despertadas por eles) na minha psiquê, talvez um olhar azul ciano afogando-se em algum lugar que só eu enxergava sob os lençóis daquele leito.
   Porque sou uma constante inconstância deixei o seu quarto logo depois de você adormecer. Olhei para a caneca de café vazia e lembrei que gosto muito mais de água tônica. Peguei um taxi e voei para o outro lado da cidade.
   Ele abriu a porta e tudo era exatamente como eu lembrava. Todas as coisas ainda estavam no seu lugar. Todas as coisas e eu.

Tensão

Silêncio...
Trégua em meio a guerra,
Paz em quem não admite, mas erra,
Tensão entre o que foi pensado,
E o que será dito,
Infinito mar de expectativas
Vivas do que foi declarado bonito.
Singelo elástico que apenas estica,
Belo momento em que vê-se o que fica,
Enquanto engana-se que é contente,
Até que não aguente,
Que se arrebente,
Lançando-se ao silêncio e ao mesmo tempo quebrando-o.

23/06/2013

sábado, 14 de novembro de 2015

Café do fim da alvorada

Senta aí,
É cedo,
Eu acabei de colocar a água pra
                    [ferver.
Não e incômodo não,
Jamais,
Nunca seria.

Todo o fim,
O confim,
O meio e o início da minha vida
Culminaram até essa pausa
Para um cafézinho
Porque acabo de ouvir
Todas as palavras que poderiam
                    [ser suas,
Sentir que todo o tempo do futuro,
Aquele que eu imaginei,
Duraria até
A última gota
De café.

Você me deu o silêncio,
Olhou,
Tentou disfarçar, mas olhou,
Daquele jeito nervoso cafeína
Você olhou para o relógio.
É cedo
E eu não quero falar sobre isso.

É tanta coisa
Que é melhor eu passar o café,
Você gosta bem forte,
E eu, cheio de leite,
E ao lembrar disso,
Deixei o sorriso morrer quando
                    [percebi
Que estava sorrindo.
Café amargo,
Você também,
E é tanta coisa,
Tanta mesmo,
Que vai se acumulando em mim
Como o pózinho no coador
E você poderia ser como um balde
                    [de água morna.

Não se atrase,
Não por mim.
Eu mal dei o primeiro gole,
Mas eu prefiro não conversar,
Talvez deixar pra outra hora,
Se você for ficar olhando
Para esse diabo de relógio
Enquanto ainda é cedo.

Deixa a porta aberta quando sair,
Por favor,
E vai com dEUS.
Os azulejos coloridos da cozinha,
A mesa patinada em tons pastel,
O cheirinho de café forte,
O nascer do Sol,
É tudo tão lindo
E tão triste,
Porque foi o melhor cafézinho
Da minha vida,
E ainda é cedo
Para saber que nunca,
Jamais,
Haveria algum melhor.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Pandora

O FIM

Foi antes de ver o tumulto acumulado no cemitério que Ignacia soube que aquela seria a parada final. O último dia de sua busca quase infindável culminara até ali.
Ignacia havia sonhado com os olhos daquele homem desde o dia, anos atrás, em que ele se foi. Os pássaros da morte a haviam guiado até ali desde o dia anterior.
Lúcia sabia que ela viria. Pouco sabia sobre o homem que acabara de ser enterrado. E quanto menos ela entendia dele, mais aumentava o oceano que ele representava em seu subconsciente.
- É você, não é? Você é a bruxa de quem ele ressentia não dar ouvidos ao conselho!
- Sou sim -, respondeu Ignacia, ajeitando Pandora nas costas.
Lúcia era a única pessoa não vestida de preto. Não era um protesto, a cor também era triste. Uma cor até mesmo mais triste que o próprio luto. E aquela roupa era a mais doce lembrança que poderia ter do cara.
- Ó meu deus! É ela? - perguntou Lúcia, apontando, com o dedo trêmulo, para Pandora.
- Eu queria... - Ignacia começou a chorar - Desde aquele dia... Eu vi nos olhos dele que ele sentiria falta dela... Até o fim da vida, sabe? Eu me apaixonei por aqueles olhos tristes -, disse, em meio a soluços daquilo que um dia pareceram ser soluções - Tentei lutar contra... Tentei trazê-la de volta desde o dia seguinte, e agora é tarde demais.
Lúcia a abraçou. Sabia como Pandora importava para ele. Porque a saudade já estava nele quando chegou à cidade, e nunca deixara de se alojar naquele olhar tantas vezes triste e distante.
- Ele deu um nome para ela, sabe? Passou as duas últimas horas da vida resmungando baixinho. Ele estava maltrapilho. Havia chegado triste e se deteriorado de um jeito absurdamente lento e doloroso. A morte lhe coube melhor que a sarjeta.
- Sei sim. É por causa dele que os pássaros do teu vestido são presságio de morte.
Aquela era a primeira vez, em três anos, desde que a comprara de volta, que Ignacia abriu o estojo chamado Pandora. Com a ajuda de Lúcia, organizou ali dentro, nos espaços vazios, as flores mais bonitas que encontraram. Colocaram ela aberta e com as flores ali mesmo sobre a lápide.
Ignacia decidiu ir para longe. Pro logar que der na telha. Tinha toda a ajuda da magia edas estrelas para conseguir o que quisesse.
Despediu-se de Pandora. Lúcia agradeceu do fundo do coração por ela, chamando-a pelo nome verdadeiro que o cara tinha dado a ela na infância.
Um passarinho pousou sobre ela, camuflando-se na cor e parecendo não existir por entre as cores.
Lúcia olhou para baixo e viu, na estampa do vestido, o presságio de morte. Ignacia enxugou os olhos e começou a caminhar.

O VESTIDO

Aquele lugar era o fim do mundo, Lúcia reclamava para si todos os dias. Ninguém caía naquele fim de mundo de propósito. Lúcia lamentava o infortúnio de ter aberto uma loja de roupas em um lugar onde ninguém tinha onde mostrar a elegância. Um rosto novo olhava para um vestido azul com desenhos de pássaros próximos da barra, a única peça azul da vitrine. Era um homem, a julgar pela mochila nas costas e pelo semblante diferente era recém chagado na cidade. Seus olhos eram tristes, ele fazia um movimento estranho com os dedos das duas mãos, diferente em uma mão da outra.
O cara entrou na loja, não sabia o que perguntar. Apenas disse:
- Esse vestido... É muito bonito. Muito bonito mesmo. Me lembra alguém que eu abandonei - soluçou.
- Quem?

PANDORA

Sabia que aquele era o lugar certo quando cumprimentou o pássaro que a encarava de cima da placa da loja. Quando a sineta tocou, um arrepio enrijeceu a coluna latejante do velhinho detrás do balcão. - Você sabe o que eu quero, não sabe, velhote? O velho carregava nas rugas um mau pressentimento desde quando havia olhado para dentro do estojo. O neto a havia chamado Pandora, apesar de não entender o porquê do nome não soar bem. Ignacia abriu bem os olhos castanhos, brilhantes feito olho de tigre, enquanto mancava até o balcão. - Quanto você deu por ela? - Pandora? - Ignacia revirou os olhos para o velho atrevido. Naquela noite, havia sonhado com o cara que a havia consultado dias antes. Ele chorava, enconstado numa janela de ônibus, resmungando o verdadeiro nome dela. - Cento e cinquenta contos -, disse o velho, esquivando-se. - Pago a metade. O velho resmungou algo como "bruxa maldita" enquanto pegava, escondida debaixo do balcão, a caixa. Ignacia deu uma espiada para dentro da caixa. - POR QUE VOCÊ LIMPOU, IDIOTA? O velho, que nem tinha parkinson, tremia feito tivesse saído do bamho quente ao vento do inverno. - Por favor, não fui eu! Foi o meu neto! A cigana se acalmou. Abriu o sorriso mais perverso que pode. - Ah, o garoto. E cadê o garoto? Já sabia desde que o outro cara havia se arrastado até a sua tenda: o objeto dentro da caixa era presságio de morte, assim como o nome e o pássaro que a cumprimentou na entrada da loja. - Vai se ferrar! - bradou o velho, com a cara retorcida de amargura. - Já que ele lavou ela, vou pagar só cinquenta. Ignacia estendeu a nota sobre o balcão. O velho abriu a boca para resmungar e foi interrompido. - Relaxa aí -, zombou a bruxa, pensando no pássaro pousado na placa da loja. - Você não vai durar mais que a nota em suas mãos. - Como você pode carregar essa obra do diabo? - Em três anos não terei mais nada a perder.

Homenagem ao meu conto preferido.


sábado, 7 de novembro de 2015

Cacos

Não é olhando pro espelho que
                   [percebo:
"Você está toda quebrada, querida."
Mas é ela: pergunta,
Sempre de dentro de mim,
O que foi que fiz dela.

É o frio
Batendo no gelo até trincar.
Ela treme, eu sorrio,
Como se a pouca felicidade que
                   [tenho
Dependesse do sofrimento dela.
É o frio:
Venta, venta, venta,
E o verão nunca virá.
Me deixo partir
Pra esfregar na cara dela
Que ela só fez merda
E a culpa é só dela:
Estou toda quebrada.

(Todos sorriem,
"O seu sorriso não tem nada de
                   [diferente,
Mas você nunca será uma deles."
Deve haver alguma fórmula
- que não ela, que está muito bem
                    [guardada a cinco chaves
                    na minha psiquê -
Que me diz: você não vai
Ser feliz,
Ter amor,
Ser um deles,
E eles... Ah,
Quão bonita é a vida deles no
                   [Instagram.

Até que sou feliz:
Hoje tomei um café,
Escrevi um poema,
Comi bem,
Dormi bem,
Não tive problema
Nenhum: de dinheiro nem de
                   [família.
O que mais caracteriza "feliz"?

Até que tenho amor:
"Eu te amo", ele disse,
Eu sei.
Que pena.
E daí?
Sabe o que eu sinto?
Tristeza. Dor.
Me ama. Eu também.
Mas e daí?
É com o meu "e daí" que me
                   [comovo:
"Você está toda quebrada, querida",
Deixa ecoar de novo.

Até que sou um deles:
Me cumprimentam e sorriem
                   [todos os dias.)

Ontem mesmo,
Lembro-me de ter ido deitar cedo,
Dormi das seis às sete
Da manhã de hoje,
Não foi difícil acordar porque o
                   [corpo estava descansado,
E não teria sido tão desagradável
Se não fosse no meu corpo e na
                   [minha vida.

Suspiro. De mim, sai mais frio:
Até quando?
Essa fadiga crônica de viver
Reduziu tanto minha expectativa
Que surpreende-me o agora.

E agora?
"Você está toda quebrada, querida."

SAI.
Você não existe mais.
Eu te vi morrer
Pelas minhas mãos
Pelo meu veneno
Pelo meu empurrão
Porque é fraca demais pra suportar.
Posso até estar quebrada,
Mas ele NÃO vai voltar.

E agora que eu nasci do teu ódio,
Quanto tempo vão durar
Meus sete anos de azar?

sábado, 31 de outubro de 2015

   Eu amo essa foto.

   O peculiar da fotografia é que ela nutre os pixels de tudo o que não existe. Eu não consigo fechar os olhos e visualizar aquele sorriso que eu sei que é lindo. Já não é lindo porque eu olho pra fotografia e parece que ela não capturou tudo. E já não existe porque não está na fotografia nem em lugar nenhum, a não ser numa pequena faísca se dissipando que é a consciência de que um dia amei um sorriso. E a imagem também omite todos os pequenos detalhes que me fazem gostar de um rosto, mas só podem ser percebidos bem de pertinho. A existência de tudo isso morre em mim porque o meu cérebro não quis guardar detalhes desses pequenos detalhes na memória, apenas sei que existem.
   Não existe a pessoa que capturou o momento, e sim um resto de sentimento por quem eu não mereço ser desculpada.
   Nem eu existo ao lado da pessoa ao meu lado porque já morri e não consigo renascer: o meu cabelo já não é o mesmo, o meu sorriso já não é o mesmo e minhas roupas não existem mais.
   Nem o lugar existe porque a aura da ternura verte sangue inocente, e o sangue verte proporcionalmente das pessoas felizes da foto.
   Apenas o sorriso que não foi capturado por completo parece existir desde sempre, porque ele não muda em cada eco de realidade que retumba na minha cabeça.

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Epifania púrpura

Ah, oceano, nefasto oceano,
Diz alto o que é a perda:
É uma marca ainda roxa
Na minha coxa
Da perna esquerda.

Eu não quero saber
Em que bares você arrasta as
                    [pernas,
Em que pernas você arrasta a dor,
Mas me diz:
Por que a minha dor me vence no
                    [cansaço?
Por que você é imaterial
No meu abraço?

Feito água que jorra ao chão,
Desabando ao oceano sou rio.
Você tem tudo o que quer,
Sorria.

Sou fria.
Porque eu morro demais
No calor que se me esquiva,
Quero qualquer sinopse,
Qualquer sinapse
De me sentir viva.

Ontem, ó oceano, ontem,
Ele me encarou pretensioso,
Deu um trago gostoso
E me acenou.

Águas passadas não movem
                     [moinhos,
Mágoas passadas não conduzem
                     [navios.
Que vertigem é olhar para o mar!
Se todos os outros lugares são
                     [epifanias
(Feito um convés onde tudo o que
                     [me resta é marcar os
                     passos doída),
Nada parece confortável como
                     [braços passados
Ou como o desejo
De me afogar.
                    
Então, eu disse a ele, me abraça,
Pra deitar a vida,
Me aconchegar recolhida
Até que o vento e os eventos
Também te carreguem pra longe de
                     [mim.

Queria, oceano, beijar tudo aquilo
                     [que desconheço
Para afogar de si esse corpo vazio
Que pende de proa a popa do navio
Que não quero deixar queimar.
Queria te beijar, oceano,
Porque cansei dessa viagem
                     [terrível
Pelas projeções que pertenceram a
                     [mim.

Ó ciano, nem tão vivo,
Marco meus passos e qualquer
                     [movimento
Há tempos.
Mas, eis que um dia, pisei tão forte
Que doeu a perna que nunca
                     [reclamou,
E, ao notar sob a saia marca roxa
Não desejei nada tanto quanto a
                     [morte
Manchando o chão com gotículas
                     [vermelhas,
Mas foi só vertigem
De olhar para as ondas que afligem
O meu reflexo, silentes.

De caída que arrasto minhas pernas
Ao primeiro lugar aberto
E peço qualquer coisa que pareça
                     [uma vida.

https://youtu.be/_q0laLr6vks

sábado, 17 de outubro de 2015

Ballet Clássico

   As palavras pareciam deslizar confortavelmente do céu da minha boca, da língua e das paredes da bochecha para preencher a acústica das ruas vazias da cidade à noite.

ÔOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOH, DELÍCIA! QUANTO É SÓ PRA DAR UM BEIJO?

   Minhas amigas começaram a gargalhar como se a minha criatividade para abordagens tivesse atingido seu auge. O homem que andava pela calçada não parecia acreditar no que acabara de ouvir. Sua primeira reação foi uma cara de susto, a segunda foi uma tímida baixada da cabeça. Olhou pro chão e começou a andar mais rápido.
   O vento batia nos longos cabelos loiros de Lúcia enquanto ela pisava, brincalhona, no acelerador, alcançando o pedestre intimidado e fazendo o motor do carro roncar. Ela parecia uma dessas mulheres de propaganda de cerveja, mas era ela que constrangia os homens, e não o contrário.
 - Relaxa aí,gracinha! - alertou, falando em meio aos nossos risos - A gente não vai fazer nada com você.
   Lúcia acelerou o carro. A rua estava vazia, então, nós cinco gritamos sem medo. Fazia cerca de um mês que ela tinha conseguido a carteira de motorista e comprado o carro a prestação. Era um Renault Sandero 1.0 que sofria um pouco para subir os morros da Barreirinha, mas bastava para dar poder a cinco amigas inseparáveis. Éramos eu e a irmã mais nova de Lúcia com 15 anos de idade, nossa outra vizinha, que era um ano mais nova, a "irmã do meio", com 17, e Lúcia tinha 19.
   Os meninos do Combate Barreirinha Futebol Clube nos convidaram para um churrasco no centro de treinamento dos atletas. Quando Lúcia estacionou o carro, não conseguíamos parar de rir. Os meninos nos receberam com a carne já pronta. Era a comemoração da minha entrada para o grupo de jovens da igreja.
   As meninas falavam sobre as nossas cantadas enquanto Lúcia preparava desastradamente a caipirinha de morango e eu fazia bolhas de sabão com a fumaça do narguilé. Era uma honra para mim ouvir que todos concordavam que eu era  a rainha das pedreiras.
   Todos pararam o que estavam fazendo para cantar o funk proibidão que começou a tocar. Lúcia colocou um gelo com LEDs na caipirinha e levantou o copo.

    LEVANTA A BEBIDA QUE PIXCA
    LEVANTA A BEBIDA QUE PIXCA
    LEVANTA A BEBIDA QUE PIXCA, PIXCA, PIXCA, PIXCA, PIXCA!

   Foi uma semana depois que fomos à pista de rolimã do parque São Lourenço para andar de longboard. A tarde foi gostosa, Lucia havia preparado um piqueique.
   Quando estávamos voltando para casa, o CD do Charlie Brown Júnior que estava no rádio parou de tocar.
 - Ih,será que riscou? - Perguntou Lúcia.
 - Deixa eu ver -, disse a nossa amiga mais nova. Pegou o CD e começou a examiná-lo.
   Enquanto isso, Lúcia tentava sintonizar alguma rádio. Mas a atenção foi desviada da direção e, quando o carro quase voou na lombada, a caçula bateu com a mão na porta do carro e o CD quebrou.
   Não foi difícil encontrar outro CD deles, visto que, poucos dias depois o Chorão se tornou a segunda pessoa importante para mim a morrer de overdose em menos de um ano.
   A chegada da nova trilha sonora foi anunciada no meio de um dos nossos passeios noturnos em busca de homens na rua para vomitar nossas pedreiragens.
 - Gente,- chamou Lúcia, - Comprei um CD novo do Charlie Brown!
   Nós gritamos e aplaudimos.
 - Calma que tem mais! Vocês lembram daquele churras lá no combate?
 - Aham
 - Quando eu tava lá na loja eu lembrei daquele dia quando eu vi um mp3 cheio duns funk massa, acho que combina pra testar a potência desse som!
   E foi entre cantadas aos homens da rua, Valescas, Catras e velocidades altas que, pela primeira vez desde que a outra pessoa importante morreu de overdose, eu senti que, apesar dos nossos muitos conflitos e desentendimentos, eu amava a minha vida.
   Essas noites fluíam como o vento que entrava pela janela do Sanderinho e a diversão tornou-se parada obrigatória pelos fins de semana.
   Mas, chegou o dia em que a mãe de Lúcia, hipercatólica e de família super dedicada à religião, bateu seu Fiesta Sedan 2010 e pegou emprestado o Sanderinho pra dar uma volta. Foi o CD começar a tocar que ela parou o carro, deu meia volta e dirigiu-se à sua casa. Escancarou a porta com força e já gritou antes de entrar:
 - LÚCIA, DESCE AQUI AGORA!
 - Que foi, mãe? Pra quê gritar assim?
   Ela mostrou o CD a Lúcia, colocando-o bem em frente à cara da filha.
- O que significa isso? Você caha bonito ficar ouvindo esse tipo de baixaria? Eu te eduquei pra gostar desse tipo de safadeza? Não quero moça da minha família ouvindo esse tipo de coisa, você me entendeu? Curtida!
   E ali mesmo, frente aos olhos de Lúcia, quebrou o CD e jogou-o no chão.
   Por um mês, os passeios noturnos morreram. Mas, eu era a rainha das pedreiras e da pirataria. Gravei um novo mp3 com todo o funk que pude.
 - Lú, toma aqui. Eu gravei um CD novo pra gente ouvir.
 - Mas a minha mãe me mata se ela encontrar esse CD!
 - Se a sua mãe encontrar esse CD, eu garanto que ela não vai nem ouvir;
   Entreguei o CD a ela. Lúcia riu ao ler a inscrição no CD: Ballet Clássico.
   Esses dias eu me enjoei de ouvir as mesmas músicas que ouço sempre. Cansei do pop, do rock, do mpb, da ópera e dos milhões de estilos que eu ouço sem nem saber o nome. E passando pela frente da casa dela, uma luz acendeu o meu sorriso.
 - Ô Lú, bora ouvir um Ballet Clássico?
 - Bora!


quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Sete de espadas

Lua cheia, lua plena,
Lua laço,
Ao léo pequena.
Lua lira ritual,
Lua louca, lua azul,
Lua bússola do Sul.

Lua nirvana, lua nova
Minha lua, nova amiga
Lua noite esclarecida,
Lua reaparecida,
Lua lá no céu do dia,
Lua, tua sincronia.

Lua longe, lua oliva,
Lua oeste me cativa.
Lua ar que me completa,
Lua leve e poeta,
Poeta viva,
Lua seleta,
Lua Selene.

Lua ela, lua elo
Da corrente
Laço belo,
Decrescente amarelo
Lua lobo, lua luz.

Lua linda, lua lenta,
Lua em touro
Olhar tesouro,
Lua leste, te estica
Sobre o meu amor
E fica.

Lua norte, lua negra
Lua alegra a sabatina,
Lua lente da matina,
Minha lua mais sincera
Longa flama, lua lima
Lua flor da primavera.

Lua redonda e robusta,
Luau ao longo da areia,
Lua augusta
Lua pulsa
Latente em minha veia.

Lua alma, eu te almo.

Lua lua lua lua lua
Lua lua lua lua lua
Lua lua lua lua lua
Lua lua lua lua lua
Lua lua lua lua lua
Lua lua lua lua lua
Lua lua lua lua lua

Carpe Diem!

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Eu vos declaro Ego e Solidão

Ela caminha,
O sorriso que fere na minha
                    [melancolia
Fere na melancolia que é só
                    [minha,
O olhar de assassina branca,
Ela caminha branca como a
                    [morte,
Ecoa na dor que me definha,
Ecoa na morte que me
                    [espanca,
Ecoa.
Escoa nas lágrimas que não
                    [contenho
Enquanto ela caminha.

Eu na cama,
Ela caminha
Até os olhos que foram tão
                    [meus,
Ou um pouco nós sós,
Ou ao menos reflexivos,
E eles sabem que me procuram
                    [em todas as
                     cadeiras do templo,
Mas eu, na cama,
Não quis ouvir dizer
À morte
Que agora só me resta esperar
                    [morrer.

Eu em cana,
Ela calminha,
Aqueles olhos me prendem
                    [porque eu sei a
                     liturgia décor.
E a morte me carrega
Feito eu fosse um buquê,
Já que tenho tanto resto de
                    [vida quanto as
                     flores,
E, eu vivo por quê,
Se a morte vestida de branco
                    [é tão linda?

Eu vazia como a cama,
À minha chama ela caminha,
E não pude ser testemunha
Porque ela é linda quando,
                    [inocente,
Suga minha vida para compor
                    [seu sorriso,
E eu morro latente.

Ao menos reflexiva,
Ao espelho ainda sou bonita,
Mas ela é mais e não resisto
A esse sorriso que atiça a dor
E já sei que sou tudo menos
                    [forte,
Por favor, me entreguem à
                    [morte
E traguem meu corpo à boca
                    [de seu senhor.

E ao pensar na morte
Vestida de branco sobre o
                    [altar,
Sei que a desejo como os
                    [olhos que a
                     esperam,
Sei que há tempos nesse
                    [olhar, espero,
Sei que nesse jogo fui mero
                    [artifício,
Pois se a beijo no altar, sou só
                    [sacrifício.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Necromancia moderna

   Duas coisas que me desligam completamente do mundo são os cheiros e a música. Esta chega a me trazer milhares de sentimentos enquanto a ouço, já os odores me paralisam enquanto fluem por meus axônios, concentrando minha atenção neles até que o gás se expanda o suficiente para que meu nariz não precise mais fungá-los.
   O fedor do suor e da falta de higiene das pessoas que compartilhavam comigo a mesma unidade de transporte público já era familiar ao meu banco de dados olfativo, e por isso o meu cérebro o ignorava enquanto eu me deixava delirar pelas cordas que soavam forte na medida que meus fones de ouvido reproduziam infielmente o Inverno.
   Era um tempo tão vazio quanto chuvoso. Eu me distraía nos floreios do violino quando aquele cheiro maldito me acordou de um transe musical e me acorrentou à nostalgia. Era uma fragrância melancólica, surreal e exagerada. Seria impossível notar que a fonte do cheiro banhou-se no frasco de perfume antes de sair de casa. Aquele cheiro de sonho indicava um renascimento póstumo que não inexistia mais que minha percepção da dimensão chamada tempo. Aquele cheiro de pesadelo era tão físico que me senti tola por só ter criado coragem de abraçá-la três vezes.
   O perfume, bem marcado pelo meu lobo frontal, se havia tornado a assinatura olfativa de um vazio emocional impreenchível. Foi aquele odor que ergueu a aura de Lúcia à minha frente e pude sentir novamente o toque do cadáver sobre o qual eu derramara, em primeira instância, curiosidade, que foi seguida de alegria, de amizade, de paixão, de silêncio e, por fim, de lágrimas. E o salgado líquido que escorrera por seu corpo inanimado parecia ter revelado uma propriedade necromântica que a trouxe à minha presença naquele momento. Ela segurava uma carteira faltando um cigarro para estar cheia e um frasco vazio de perfume. Sorriu para mim e entrou na fila para descer do ônibus.
   Quando desci para segui-la, seu único vestígio era o cheiro. Mas o cheiro se afastava de mim tão rápido quanto o biarticulado onde estive antes. Eu ainda ouvia os impulsos sonoros atrapalhados pelo mau contato nos fones de ouvido, gotículas da chuva gelada do inverno caíam sobre mim.
   A nostalgia da (in)existência repentina dela é que a fragrância poderia estar no corpo de todas as pessoas da cidade. O que odeio no perfume dela é que é tão popular que todas as casas de Curitiba guardavam um frasco naquele. O fatal daquele cheiro é saber que sentirei falta dela em todos os lugares, mas ela nunca mais estará em nenhum deles. O Inverno acabou, eu desabei.




segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Brincando de roleta russa matou um vira lata ferido

Ah, que deplorável se vivo
Mendigando meus relapsos.
Feito o cachorro do Fernando
Tolerado pela gerência por
                    [ser inofensivo,
Me arrasto de caco em caco
Até o próximo resto de vida.

Mas você é assim:
Quer ter conforto,
Que se dane a mira,
Vai lá e atira
Em cachorro morto.

Pare de olhar pra carniça que
                    [é rude,
Você já descartou o que não
                    [queria
E eu não quero mais
Te dar bom dia.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Não pode

Deve ter sido esse vento
Assobiando, assim
Sem pressa, sua voz

Só pode ter sido,

Só pode.

Tantas vezes eu te quis
Noutro olhar amorfo,

Mas o vento te traz
Em memória avolumétrica,
Deixa d'eu livre, voraz.

Eu me perco em ti,
Onda a onda amável,
Teu cabelo é in ventável
Tantras nossas timidezes

E em tuas curvas crescentes
Tão turvas subconscientes
Se em sibilo me consentes,

Ah, pode?

Deve ter sido esse vento
Assobiando assim
Sempre essa sua voz

Porque já não posso.

Estou preso ao cinto,
Preso a não pensar
No vento sucinto,

Porque ele me brisa,

Mas eu não te sinto,
Porque ao primeiro desleixo
De meus olhos atrevidos,
Grudo ao meu peito meu
                                    [queixo.

Teu eco que vem do vento
Com poder, me desconcentra,
Sem teu eco, descontento,

Não fode.

Não estraga agora
Que eu me acostumei
A te deixar para fora,
Agora não pode.

Volúvel libido
É a lei do proibido
Que lembra você.

Jamais deveria
Dar ouvido atento ao vento

Que te projeta aqui junto
À minha dama, conjunto,
Ofuscando a mente,
Pois não deveria, jamais

Existir feitiço
Feito a ti, é isso,
Só poderia ser isso

Que você me faz,

Mas, eu já me deito
Para te deitar ao sonho.
Teu olhar é decidido
E minha fraqueza aceito.

Nessas vis leis de atração
Aquilo que tanto explode
É o desejo proibido

E não pode.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

##### ### #### receptor

Alô? Sou eu, de novo,
Tá um pouco chiado aqui.
Você tem um minuto? Consegue me
                              [ouvir?
Eu só queria dizer que #####
Ou talvez só queria entender por que
                              [#####
Ou ouvir de você o que foi que
                              [#####
Mas que droga de telefone
Para disfarçar o quanto odeio
Essa muda iniciativa
De mudar minha disfunção
                              [expressiva,
Acho que rompeu.

Será que dava pra ouvir elas,
Que não querem parar nos olhos,
Ou se misturavam ao chiado?
Lentes de contato aparto
Que agora borram a visão do meu
                              [quarto.

Oi? Ah, oi.
Recepção vaga esse teu alô.
Acho que tenho ouvidos bons,
Porque em cada chiado captam
O movimento dos olhos pra baixo
E captam o gosto salgado das
                              [bochechas.
E recheiam-se da chuva que CHIA
                              [C.h.i.a e chia
E chiam
Mim guando mais um pouco.
Alô?
Abri a boca para #####
E ##########,
Deve ter cortado.

Achei que ##### pouco,
Mas eu entendia tudo o que não
                              [falei,
Deveria tentar só mais uma vez.

Alô?
#####
É você de novo?
#####
Tu tu tu tu tu click.

Liguei para te dizer que não sei dizer
E agora até eu estou chiando
Porque até mesmo a sua voz era
                              [muito bonita.

sábado, 19 de setembro de 2015

I came here only to see you

I could love you today,
I could blame not your mistake
But you feel no feeling
And your speech is fake.
Now everyone knows you love
                  [chasing a skirt
And I know I'm  protected
                  [where I've been hurt.

You may think having three of
                  [us
Would be for you a kind of perk
But they're my sisters
And the truth now lingers:
You're nothing but a jerk.

Where's your force now?
I hope you so felt like
                  [kissing your shame,
If your mind can be perverse
To lie the same lies
To a different universe,
You can be sure
I came here only to see you
Cry.

Can you feel your freedom?
Do people like you?
Weren't you the one?
What a shame on a corrupted
                  [boy.

I've been fooled before,
Isn't it what people say?
You may think I'm destroyable
By your words, so loveable,
But I won't miss you when you
                  [go away.

Now, to you, we'll never belong.
Hope you know I'm awful,
My sisters are beautiful,
I know they're strong,
And you ain't hurt none of us.

If you like playing with fire
One thing you must learn:
We're the flames that shine,
You're the coal to burn.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Envelheço na cidade

Seu corpo vagueia
E cadê você?
Suas palavras falam,
Mas dizem o quê?

Já fazia mais de um mês
E não tem como não notar
Esse silêncio de você,
Cadê você em você?
Quando foi que você deixou de
[existir?
Porque eu senti sua falta,
E muito,
E você nem viu ainda
Nem eu vou te avisar.

Não é porque eu sou invisível
Que inexisto,
Mas fica difícil ser você
E tentar esconder
Como se não existisse
E não transparecer
Como se não sentisse
Porque eu senti sua falta,
E muito,
Cadê você?

Não é porque eu prometi,
É porque você merece
E porque sinto sua falta
E porque suas palavras não
[dizem mais nada
E eu não consigo encontrar
[você,
Feliz aniversário.

Eu tava contando os dias
Pra tentar chamar a tua
[atenção
Porque você é inatingível
E eu, idiota.

Feliz aniversário.

Eu queria ser a primeira
E fiquei contando os minutos,
Feliz aniversário.

Eu não consigo esquecer
Nem mesmo o que deveria
Ou o que queria,
Imagina só se por algum dia
Eu acordaria
Sem procurar suas notícias?
Imagina se eu OUSARIA
Me esquecer de você?

https://youtu.be/CdqoNKCCt7A

domingo, 30 de agosto de 2015

O cão e a cobiça

Pelo espelho da mente o poeta observa
Beleza lírica tornando-o pleno,
Ao queixo caído penetra o veneno
Enquanto chora interna Minerva.

Caído da boca, coração em conserva
Transcende do seu sentimento dreno,
Ouve do diabo o argumento ameno,
Do querer ter tudo não mais se enerva.

De tudo o que dói, cobiça é o cão,
Poeta sucumbe à feitiçaria
E vende a alma em sua tentação.

A regra é clara como a luz do dia:
Dá pra ele ficar com o coração
Ou escrever alguma poesia.

Para gostar de escrever

   Sou filha de escola pequena. Não em extensão, visto que para a gente que é pequena a eternidade que durou até a quarta-série (não me importo com o nome novo de "ano" que o governo deu à minha amada quarta-série), nunca seria possível explorar todos os balanços ao máximo nem contar as partes do escorregador em que a tinta desbota. O que empequenava a minha escola era a pouca quantidade de alunos, geralmente uma turma por série de um número de crianças que oscilava entre o 17 e o 25.
   Reflexo da baixa mensalidade, do enorme número de bolsistas - e eu, filha de professora, me encaixava nessa categoria - e dos poucos alunos, a estrutura, e logo a biblioteca da escola, não era daquelas.
   Meu lugar preferido era aquela salinha do tamanho de um banheiro doméstico de classe média-alta cheia de estantes com não muitos livrinhos e um tapete cheio de almofadas para sentarmos e lermos.
   Quando éramos trazidos à biblioteca, nas aulas de língua portuguesa (que englobavam a literatura e a redação), a maioria das crianças fazia uma roda circundando o Guinness Book ou a colorida enciclopédia Disney, e eu, desinteressada em informação inútil e talvez cansada de títulos da série Vagalume que todos que passamos pela quarta-série conhecemos, como A Ilha Perdida ou O Escaravelho do Diabo, tinha como favoritos uma pequena montanha de livros (talvez uns 9 ou 10 volumes) desconectados entre si que fizeram meu gosto pela leitura e pelo humor levando o conveniente título "Para gostar de ler".
   E já desde aquela época eu crescia escritora. Mas, lendo apenas por diversão e escrevendo o que eu sabia escrever (e com o que gostava de brincar), meu caminho desrumado pelo mundo das palavras seguiu os versos da poesia, e com a facilidade que Luís Fernando Veríssimo, Rubem Braga, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Carlos Drummond de Andrade me divertiam naquelas tardes sob a janela da salinha biblioteca, acabei deixando de lado a busca pela crônica.
   Aprender sobre a crônica nas aulas de redação dificultou mais ainda. Hoje, estudante de Letras, li sobre a história e a teoria da crônica e ainda não sei explicar com segurança o que ela é. Mal pude naquela época. Mas, escrever sempre me fez bem, e a minha incapacidade de prestar atenção em uma única coisa ou a ocorrência de algum sentimento paranormal ou a graça de sentir a caneta riscando o papel do caderno com algo que não fosse matéria a ser estudada ou alguma deixa de fluxo de consciência acabaram por acumular na gaveta de baixo da minha escrivaninha uma pilha de rascunhos de momentos ridículos e perdas de tempo literárias que estava, até hoje, a esperar que o tempo ensepiasse os papéis e borrasse a tinta das canetas e quem sabe um dia puísse todas as folhas.
   Mas, me divertindo recentemente com um certo cronista que adora escrever palavrões e do qual não pretendo citar o nome e lendo um pouco sobre a história da crônica, todos aqueles rascunhos me vieram à mente e começaram a doer no coração. E o convite a continuar a escrever foi de Oswaldo Montenegro, que tocava Intuição há mais ou menos uma hora no rádio do carro quando eu vinha para casa. E Oswaldo está certo. O mundo já está cheio de best sellers e de clássicos da literatura e eu sou só eu. Não preciso de mais para gostar de escrever.
   Tenho meus problemas medíocres, meus amores medíocres, meu cotidiano medíocre e tudo já basta para me maravilhar da vida todos os dias. E, dando atenção à simplicidade de tudo que pertence à minha vida - a escola simples, a biblioteca simples e a literatura simples e medíocre por definição -, sou uma pessoa medíocre com problemas medíocres de origem medíocre que lia mediocridades e agora escreve mediocremente. Mediocremente e satisfeita. E a crônica... Ah, como é gostosa.

sábado, 22 de agosto de 2015

Gris

Para ser sincera,
Sinto um vazio
Como se depois do primeiro
[dia de chuva da primavera
Encarasse numa poça d'água
O reflexo de um ipê sem flores
[amarelas.
Ou o meu reflexo
Carregando um ramalhete sem
[cor
Ou minha reflexão me
[encarasse magoando
Feito mau agouro de mim
[mesma
A mando desse estúpido
[coração amando.

Sinto tua falta
Em todas as cores que não
[distínguo,
E quanto mais cresce em mim
[essa quimera,
Mais mínguo
Te procurando nas flores da
[primavera.

Ensepiecendo na tua ausência,
Sou insípida insuficiência
E vejo gris
O amarelo que não tem cor
Sem teu sorriso.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Bohemian Rhapsody

   O display do rádio relógio digital parecia um borrão de luz, dando presença - e não vida - ao quarto escuro. Lúcia fechou os olhos, esfregando-os, bocejou e abriu os olhos novamente. O horário que os pontos de luz verde marcavam seria doloroso se Lúcia tivesse a certeza de estar consciente o suficiente para se importar com a hora da madrugada em que o sono foi interrompido.
   Já recuperando a despertude, uma mistura de náusea e pânico fez fraquejarem o quadril, a virilha e o estômago, cada um destes a seu modo indefinido entre o bom e o ruim jeito de arrepiar, ao farejar o cheiro azedo do álcool que amanhecia raso nos fundos das garrafas espalhadas misturado ao cheiro forte do cinzeiro molhado. À medida que Lúcia enxergava os dejetos que compunham a morbidez do quarto, seu cérebro recriava, segundo a segundo, as cenas do episódio ocorrido horas antes, no início da noite.
   Bebeu os quatro dedos de líquido restantes à garrafa de vodka e deixou que os demônios do medo, da dúvida, da raiva e, principalmente o da coragem - o mais perverso e destrutivo de todos - tomassem sua psiquê. O "Eu vou matar vocês dois!" proferido horas atrás parecia, agora, mais que uma simples exclamação de raiva e desapontamento, um atestado do destino cru, em cuja inevitabilidade a distorção mental causada pelo álcool fazia que Lúcia cresse com convicção.
   Foi com a convicção de não estar dormindo nem acordada que o ímpeto da vingança levantou seu corpo da cama e cambaleou-o até a porta que fazia fronteira com o frio da madrugada.
   O vento soprava incansável e incessantemente como o fluxo da consciência que beirava entre o semiconsciente e o inconsciente alcoólico na cabeça de Lúcia, que perguntava ao próprio discernimento se o vento vinha para atestar mudança ou sabedoria. E como todas as outras vezes em que o caos indefinia o que pensar, assumiu como certas as duas possibilidades,
   Os tropeções não a impediram de chegar ao endereço tão visitado anteriormente, casa de tantas lembranças que pareciam pertencentes a uma vida que não à sua, pois a vida nunca lhe teve simpatia. Passou fácil pelo porteiro que, inocente das mudanças que o vento trouxe, a chamou pelo nome e disse bom dia. Lúcia passava com o rosto virado para o lado para que ninguém visse a cara de bêbada. Tocou a campainha decidida. Estava nojenta, fedia, tinha vontade de vomitar. Os olhos estavam inchados. Sabia que em algum momento seus pensamentos culminariam ao delírio. Já não era a mesma pessoa, sentia-se morta. O corpo servia apenas para fazer o que deveria ser feito. Estava mais do que decidida, seriam os dois e depois ela.
   De dentro do apartamento, a voz de uma mulher vulgar e de espírito nojento anunciou "Amor, eu vou atender à campainha!". A voz ridícula despertou a colossalidade do demônio da coragem, que já tinha uma mão no gatilho e aprontou-se a gritar "Sua vadia!" no momento em que os cinco tiros empurravam para longe a vida da bela moça loira que vertia em sangue por abrir a porta.
   Lúcia deu cinco passos para a frente, pisando sobre o corpo-capacho no passo número um. Sabia bem o caminho para o quarto. Ele tinha os olhos caramelo bem arregalados e não se movia, já olhava fixado em algum ponto para além da porta do aposento quando o revólver entrou no quarto seguido de Lúcia. O demônio da coragem parecia não existir no momento em que ela o viu fraquejar. Queria pegá-lo no colo e dizer que tudo ficaria bem. Tarde demais, dizia o demônio. E você é a próxima. Mas a mente de Lúcia abriu espaço para o demônio do medo (des)controlar sua mão, que já começava a tremer. E a mulher já havia caído desmaiada antes dele terminar de pronunciar seu nome. E antes do desmaio, nunca havia existido a certeza de estar fora do universo onírico.
   "Você tem direito a uma ligação". Lúcia levantou o olhar. Estava numa sala mal iluminada, apenas quatro paredes, uma escrivaninha, um aparelho de telefone, duas cadeiras e uma porta cheia de trancas. Nada com que distrair o olhar. A policial apontou o olhar para o telefone e Lúcia discou o número da mãe. A velha não atendeu. Lúcia prestou atenção minuciosa à voz confortável da mãe na mensagem da caixa postal. "Oi, sou eu! Devo estar ocupada e não posso atender, mas você pode deixar uma mensagem para mim assim que o telefone fizer 'piiii'!". Um nó na garganta formou-se e rapidamente desmanchou nas lágrimas que interrompiam o recado à caixa da mãe.
   Explicou tudo de que lembrava. A sensação de ter matado uma mulher a fez refletir sobre o quão cedo tinha jogado a própria vida fora. Apertou o coração imaginar que a mãe choraria ao ouvir o recado. Foi difícil imaginar a mãe tendo que seguir a vida e agradeceu à secretária eletrônica por não ter que falar com ela. Ainda sentia vestígio da embriaguez - nenhum relógio na sala mostrava quanto tempo havia passado - e percebia o delírio se aproximando quando lembrou de pedir que a mãe deixasse aos familiares e amigos o recado de que ela os ama. E o tempo da ligação acabou quando Lúcia se deu conta de que se nunca tivesse nascido, nada teria acontecido.
   Lúcia foi trancada na sala e deitou-se em um canto, no chão. Os quatro demônios a recebiam na suprema corte da culpa. E a condenavam. Lúcia tentava fugir, e como um coro maldito, os demônios a impediam até mesmo de completar suas falas. E o segundo período de sono foi mais perturbador que o primeiro. Estava cansada de ter que suportar.
   Não foi do dia para a noite que a sanidade transformou-se em inquietude em cada arrepio que a fraquejava enquanto aguardava insone por um sinal de saudade. Mas não. Já fazia um mês que ele a havia abandonado para ficar com a mulher loira e bonita. Lúcia foi mais que descartada, simplesmente foi apagada como se nunca tivesse existido. Foi amada e deixada aos cães da morte. E, antigo companheiro, o demônio da saudade a fazia sentar no sofá e encarar o telefone por horas, esperando uma ligação preocupada, um sinal de arrependimento, mas nada. Cansou de contar as vezes em que atendeu o telefone e baixou o sorriso para os moços do telemarketing.
   A boemia foi consequente. Fumava o cigarro que tinha gosto de beijo. Bebia qualquer coisa. Parava para morrer cada vez mais nas músicas tristes que preenchiam os lugares vazios. Caminhava pelos lugares necromânticos que ressuscitavam lembranças dele. E no início da noite do assassinato, caminhava até sua praça preferida, queria se sentar no seu banco preferido e apreciar a vista. O "Eu vou matar vocês dois!" mal assustou o casal sentado no banco. Mais tarde, o quarto foi transformado num imenso cinzeiro e depósito de garrafas pequenas e vazias como Lúcia.
   Estava sendo transferida a um presídio para aguardar o julgamento, o último andar do prédio fazia o cadastro das fichas criminais. Lúcia rabiscou alguma coisa na mão enquanto preenchia a ficha com seus dados. Os papéis quase voaram para fora da prancheta quando o vento soprou forte da janela. Olhou para o guarda que a acompanhava e, em plena lucidez, entendeu a que tudo culminava.
   "Vocês podem ver... Nada é importante. Nada mais é importante para mim.". O guarda olhou para cima, pensou no que poderia significar. Não precisou fazer muito esforço. Lúcia correu com todas as forças em direção à janela, conseguiu quebrar o vidro e pular.
   Na mão esquerda, estavam rabiscadas algumas palavras. "Sei que apesar de tudo o vento ainda sopra forte".

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Nota: recomendo a versão interpretada por Emilie Autumn de Bohemian Rhapsody porque em sua versão, ela une a ópera ao desconfortável, representando bem a bagunça nos pensamentos de Lúcia. Apesar do instrumental menos impactante que a versão original, Emilie Autumn sabe oscilar seu canto entre o esôfago e a garganta com harmonia.


quinta-feira, 6 de agosto de 2015

O capitão e o corvo

Perdi os miolos
Entre os extremos, subjetivos,
Pois, na falta de qualquer coisa
        [que não concebo
E faz teu pensamento recorrer
        [a mim,
Recorro a meus inconscientes
        [nocivos
Tentando sentir tua presença
Com a necromancia dos vivos.

Entre o ser e o não ser
Já não indago essa dor índigo,
Pois sou e não sou
E escrevo agora a poesia
Ligeiramente tardia
Que agora flui de meus
        [umbrais,
E se inexistem tempo e
        [distância,
Quem diria nunca mais?

Dessas coisas que o corvo
        [grita
E não dá para saber
Se é demônio dele ou
        [inocência,
Seria melhor apagar o anil
Brincando com as palavras,
Pois é verdade que sou infantil.

Vamos brincar de dicotomia,
Posso virar xiita do Maiakovski
Pra gente fazer de pé de guerra
E seremos poesia
Nesse miolo inconciliável
Incomodando o racional.

Capitão ou demônio ou
        [pássaro azul,
Entre ser ou não ser,
Os dois,
Entre ter ou não ter,
Depois,
Entre o revolucionário e o
        [homofóbico
A poesia incomoda os
        [dogmas.

Capitão ou demônio ou
        [pássaro azul,
Entre escolher
Lado A ou lado B,
Teu silêncio é poesia.

Parece faltar algo que não concebo quando tudo a ti deveria ser pleno.

sexta-feira, 31 de julho de 2015

e = m.c²

Tenho feito déjà vu
Lembranças de outro universo,
E como aqui foi infeliz
Eu acredito no multiverso,
Eu vou te procurar no
[multiverso, meu amor.

Fecho os olhos, você me sorri
Como nunca sorriria aqui,
Eu sei que nós não estamos
[tão longe,
A quantos anos-luz eu te
[encontro, meu amor?
Minha nave está de partida
Para o lugar do multiverso
Em que o teu olhar não é ferida
Ao meu querer.

Que difere estar perdida no
[espaço ou no mundo
onírico,
Se é tudo parte do multiverso?
Se tudo me parte nesse
[universo,
Onde hei de te amar?

Porque eu encontrei estrelas
[axiais
E paraísos glaciais
Em tantos milhões de galáxias,
O multiverso é o axioma
De cada sonho que o tempo
[retoma
Estar na tela colorida em que
[se projeta o real.

E de repente, a dobra espacial
[do tempo acaba,
E eu não sei em que momento
[deixei meu corpo virar
luz,
Minha nave quebrou em algum
[lugar do multiverso,
Milhões de anos-luz distante
[de nós,
Será que ainda dá pra te
[encontrar?
Será que esse universo está
[muito longe?

Já não sei há quanto tempo
Essa fenda me abriga,
Não sei o que o tempo é.
Sei que periga
De eu nunca mais sair daqui,
Quantos outros eus
De outros universos virão te
[procurar?
Será que algum vai me
[resgatar
Dessa solidão?

Eu só queria te encontrar no
[multiverso, meu amor,
Eu sei que sou feliz no
[multiverso.

sábado, 25 de julho de 2015

Uma barra de chocolate belga

  Uma barra de chocolate belga de cima da mesa de centro desafiava o olhar estressado de Lúcia. Não posso, pensou. As palavras “início de dieta” marcavam o coração mais que o papel do calendário gigante pendurado atrás da porta.
  Lúcia suspirou. Correu os olhos pelo resto da sala em busca de consolo. Evitou com as forças que pôde olhar para as almofadas macias e viscoelásticas de cima do sofá novo, pois sabia que a mínima pausa de seu rito matutino resultaria em atraso para o escritório. Foi desviando os olhos do sofá que notou o inferno paralelo do espelho.
  A maldita lâmina de prata era certamente o objeto mais cruel da casa. “Você é gorda, ‘Lúcia”, dizia a vítrea superfície, sem medir as palavras. Mas isso não era novidade aos ouvidos de Lúcia. Os olhos se pareciam ter atraído pelo chão ou pela posição baixa, e as sobrancelhas pareciam querer se beijar à medida que franzia a testa.
  Lúcia podia sentir novamente o bafo do primeiro dia de verão soprar suas bochechas rechonchudas e sorridentes. A mãe lia um livro, sentada no banco da praça, e os irmãos faziam fila para descer do escorregador. Algumas crianças brincavam na gangorra, Lúcia correu para brincar junto a elas.
  “Não deixa a gordinha brincar na gangorra!”, gritou a Regina George da patota. “O seu problema é que você é uma baleia, não dá pra brincar de gangorra com você”, diziam as meninas. Lúcia correu para a mãe, chorando. “O seu problema é que você é uma baleia”, dizia o espelho. Lúcia correu, cheia de lágrimas, os olhos pela sala.
  O livro de Fernando Pessoa ainda estava aberto no braço do sofá, e, nele, a Lúcia rechonchuda encontrou seu alívio.
  Sentou-se no sofá - muito mais confortável que a minúscula cadeira de escritório projetada para gente magra - e leu a estrofe já aberta de Tabacaria:

“(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida)”

  Como que acariciada pelas mãos do poeta, Lúcia se deixou relaxar no sofá e ligar para o chefe dizendo que estava doente. Até decidiu que quando fosse trabalhar, exigiria uma cadeira maior. Sentada de costas para o espelho, passou o resto da manhã se deliciando numa afrodisíaca barra de chocolate belga.